quarta-feira, 27 de abril de 2011

Uma Costela


pintura de  Jesus Gómez Costa


Três dias e duas noites de caminhada extenuante. As sandálias de Adão se arrebentam; Eva tropeça e cai, ficando para trás sem que ele a perceba.
O deserto após o paraíso é semi-árido; o chão é duro como pedra. Adão sente seu vigor físico se exaurir. Sobre seus ombros pesa mais a responsabilidade de ser o autor de um ato de desobediência que desencadeara para toda a humanidade uma vida de miséria física e moral e a alienação com o Criador, do que o peso de Caim e Abel amarrado sobre suas costas.
Gritos de crianças desesperadas ao pé do ouvido despertam Adão do seu entorpecimento mental, produzido por uma culpa dilacerante e por um sol causticante. Adão volta vinte passos; Eva está lúcida. Mas não tem forças para se levantar; o sangue esfria e todo peso de uma fadiga redobrada cai sobre seu corpo com o pessimismo que um cansaço extremo produz. Por hoje Eva já não conseguira mais andar. Instintivamente Adão solta os meninos no chão e pega sua fêmea sobre seus braços.
Horas depois, Eva acorda ao lado de seu marido, que conseguiu alcançar antes que a noite caísse, uma arvore frondosa para repousar. Mesmo tendo apenas cochilado nas noites anteriores, Adão não consegue serrar os olhos. Pois, por ironia da natureza, uma dor de cabeça por falta de sono impediu-o de dormir.
Ate esse momento Adão ainda não tinha reparado em Eva. E todo o seu cuidado com os filhotes e sua mãe era impulso irrefletido de pai de família. A sua preocupação era existencial, não como individuo, mas como progenitor da raça humana.
Ao despertar e olhar o semblante abatido do seu homem, os temores e aflição de Eva voltam novamente. Ela não pondera assim como ele, nas conseqüências desastrosas que o ato do casal produzira em toda a sua descendência, e muito menos na sua condição física, higiênica e pessoal lastimável, mas unicamente na vida integral da pessoa que era seu companheiro por imposição divina e sentimentos ternos e humanos. O bem estar do seu esposo era o que realmente importava para ela naquele momento.
Há quase dois dias eles não trocam palavras. A comunicação básica era visual. Tirando sua roupa e a dele, ela se põe sobre ele. As suas mãos, agora descuidadas e ásperas, mas ainda delicadas, massageiam os músculos tensos do corpo exausto e desidratado de Adão.
Na medida em que ia relaxando o seu espírito desesperado se acalmava. E só então ele começa a perceber que caminhava ao seu lado e agora diante dele, uma mulher maravilhosa e uma companheira imprescindível.


Que contraste! Ele, macho em todo tempo, reflexão profunda, decisão objetiva, passo e mente pesada, enfim preto e branco. Ela colorida em todo o seu esplendor de sensibilidade, carinho, leveza e multiplicidade de interesses supérfluos que encantam e enche á vida do ser humano.
Deitados as suas mãos meigas percorrem o corpo de Adão, e suavemente sobem ao seu pescoço, e com um sorriso de ternura ela encontra nos olhos fundos daquele homem, um olhar que a contempla em toda a sua flor de feminilidade e doçura. Eva estava suja, mal cheirosa e despenteada; mas por ser notada irradiava em seu semblante uma alegria que tornava sua beleza insuperável.
Os seus membros se tocam os seus espíritos se encontrão. Adão se excita, e pelas circunstâncias se envergonha também. Eva sorri maliciosamente. Estando ela por cima, pela primeira vez, ela faz todo o “serviço” sozinha.
Findo um ato sublime de amor e de desejo, Adão vira Eva por baixo de si, e naquele momento amando-a profundamente quebra o silencio respeitoso e solene que se prolongava entre eles:
 Eva o meu ato de desobediência no paraíso, foi uma atitude de fidelidade a você. Eu estava consciente e poderia ter recusado o fruto de suas mãos, esperando que Deus criasse para mim outro ser, enquanto você se perdia. Mas o que seria a outra, se você é mulher no seu sentido mais plena, e feminina na sua acepção absoluta.
Deve Deus já ter feito e inventará, pois nunca deixara de ser Criador, mundos universos e reinos incomensuráveis e monumentais, para muito além de nos e de nosso entendimento. E tudo o que Ele faz é repleto de poesia, graça e significados inexauríveis; e em você minha flor do Éden, Ele imprimiu partes da essência encantadora do seu Ser. Mulher! Toda a sua beleza, sensibilidade e brandura emanam dos atributos e da riqueza de sentidos do amor e da alegria que existem no ser de Deus.
Nenhuma outra mulher poderia fazer esvanecer-se a sua imagem de minha alma. Indubitavelmente por ser a primeira você é a mais linda e surpreendente de todas as mulheres que virão. Sem você seria horrível, alem de só eu não me sentiria homem. Seria como se me carecesse alguma coisa. Sinto que algo me faleceria bem aqui dentro de mim. Enfim seria como se faltasse algo tão entranhado em mim, como... Sei Lá!... Uma costela, por exemplo!


Gresder Sil



(Cada vez que leio esse texto gosto mais, criado pelo meu amigo Esdras Gregório, e é também um dos textos que faz parte do meu "Quarto") 

7 comentários:

Anônimo disse...

Mozão, este irmão gosta mesmo da fruta kkk, que nem eu. Adorei. Beijo, te amo.

***Adriana Rocha*** disse...

É meu bem, ele se faz de durão, machão, tudo com ão kk, no fundo ele é um apaixonadão pela mulherada kkkkk é um bom garoto...

Casal 20 disse...

Uau! Vim aqui por causa do seu comentário lá no blog do Claudio. Aí, acabei lendo outro texto, mas acho que você estava falando era desse.

Agora, como que um texto tão profundo como esse só teve um comentário? Tudo bem que é o comentário do Cláudio, uma honra, mas será que ficou todo mundo perplexo?

Bem, eu estou, pois nunca vi por esse lado. Assustou no início, mas aí eu reli e reli. Então, percebi o lance do vazio da costela... que lindo! Humano, sincero, lindo!

Gostei.

Abraços sempre afetuosos.

***Adriana Rocha*** disse...

Casal 20. Na verdade não me apego muito a isso de quantidade de comentários. O que gera muito comentário é fofoca da vida dos outros e coisa do tipo o que na verdade não me interessa também, mesmo porque, nem sempre tenho tempo de postar, ou de responder, estou tentando administrar esse blog com calma, rs é tudo muito corrido pra mim, porém, e fico muito feliz por terem gostado, esse texto me fez ficar de bem com Adão, kkkkkk. Também não curto muito postar textos de outros ou opiniões que não venha de encontro com a minha, Obrigada casal pela visita e volte sempre que quiser.
Beijo o coração...

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

O que me chamou a atenção foi o fato do autyor ter descrito sobre a experiência da Eva ficar "por cima" (pelo menos foi o que entendi).

Há menos de 100 anos, acredita-se que a maioria dos casais brasileiros só costumava experimentar o sexo na forma do homem dominador, "por cima", que é o famoso "papai e mamãe". E, lamentavelmente, a Igreja Católica contribuiu bastante para isto (se bem que outras irgejas evangélicas também alimentaram uma sexualidade reprimida também).

Contudo, vejo como uma coisa anti-bíblica não se pensar no prazer da mulher ou mesmo não conceber que faz parte da relação do casal a iniciativa da fêmea. Vejamos, pois, que no Shir Hashirim (Cântico dos Cânticos) a esposa procura pelo esposo.

Segundo O Zohar, livro cabalista não muito aconselhável para evangélicos (risos), há uma suposta explicação do Rabi Simeão ben Yohai, o homem e a mulher não foram feitos face a face, quando se diz em Bereshit (Gênesis) que Deus ainda não tinha feito chover sobre a terra e que ainda não havia homem para cultivá-lo, intepretando que o significado de tais citações bíblicas seriam metáforas da imperfeição do homem. Então, quando Deus cria a mulher para servir de auxiliadora do homem, este auxílio, ajuda ou apoio, um passa a apoiar-se no outro. Surge aí a relação face a face.

Para a interpretação judaica cabalista, a elevação do vapor da terra (Gn 2.6), que naturalmente a humedece, seria o desejo da mulher pelo homem, considerando que é da fêmea que deve provir o impulso inicial para mover o macho.

Ora, isto é bem interessante porque ensina que o homem, como um bom jardineiro, deve cultivar em sua esposao erotismo e bons sentimentos, amando-a e cuidando bem dela, afim de que ela, despertando-se como uma flor para o erotismo e tornar completa a relação. É quando macho e fêmea estão face a face e juntos entoam o Cântico dos Cânticos onde a sexualidade torna-se uma ferramenta capaz de proporcionar paz e equilíbrio ao casal.

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

Em tempo!

Observem que o mito sobre a criação do homem na Torá dá a entender algo que é bem profundo.

Segundo a ciência, os ancestrais do homem não faziam sexo face a face. O macho transava com a fêmea "por trás" (nada contra alguém gostar desta posição), como fazem muitos animais. Porém, parece que, já no neolítico, o homem teria descoberto o prazer face a face.

Ora, não é interessante vermos como que a tradição javista da Torá preservou resquícios de uma memória ancestral?!

***Adriana Rocha*** disse...

Rodrigo, ainda bem que conhecimento não ocupa espaço, aprendi um montão agora, e gostei muito!! Obrigadão!!

Voltem sempre

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